sábado, 29 de dezembro de 2012

DESVALIDOS . A RÃ REBENTOU.


DESVALIDOS
(crónica de Armando Fernandes no jornal O Ribatejo, 20 Dezembro 2012)


"Os desvalidos, no seu desfavorecimento, procuram perceber a causa de uns tantos serem validos apesar de não serem válidos."

"Com a crise acelerada, os debates acerca do entendimento do que é a caridade e a solidariedade invadiram os púlpitos televisivos. transformando Isabel Jonet em isco de conversa propícia de confissões de práticas caritativas, frequência da catequese, prófugos do batismo, mais os compungidos quando dão esmola. A determinada altura num desses encontros do diz tu, direi eu, falou-se nos Asilos da infância desvalida, instrumento assistencial que após a instauração da democracia perdeu a designação de asilo. As crianças passaram a merecer (e merecem) cuidados precisos, tudo levava crer estarem enterrados os fundamentos da negregada designação de desvalida.

De um momento para o outro, não assim tão momentâneo, o nosso remediado viver desabou, passando a maior parte da população portuguesa à condição de desvalida. Logo sem validade. Findou o prazo para ser interessante, feliz, claro, válida. Os sem valimento coçam a cabeça à procura da causa do desfavorecimento, porque lhes sobra tempo nada lhes escapa, tomados de um turvo furor procuram perceber a causa de uns tantos serem validos apesar de não serem válidos, logo incompetentes para o desempenho de funções da maior importância.

Os validos existiram sempre, ter uma boa proteção é meio caminho andado na direção do êxito em toda a espécie de negócios, por essa razão se dizia: quem não tem padrinhos morre mouro. Acrescento: desvalido.

Inúmeros validos vivem em constante conflito com a proficiência, no entanto, o facto de terem sido bem batizados outorga-lhes meios e instrumentos de mão beijada, neste pormenor eles beijam mãos, faces, tudo quanto os favoreça, levando-os a terem entrada nos gabinetes da opacidade negocial, da decisão a seu favor. E assim tem sido, a recordar outros tempos, apenas mudaram diversos apelidos, os instrumentos delicadissimos de controlo, agitação, propaganda e enlameamento dos inimigos.

A fúria dos desvalidos vai aumentando ao modo da rã candidata a ser boi, os validos considerando-se monumento nacional exaltam a lengalenga dos brandos costumes, desprovidos de conhecimentos sobre a nossa História encolhem os ombros desvalorizando os sinais de fogo (título de um romance de Jorge de Sena). Nunca leram, nem vão ler. Os desvalidos vivem dotados da mesma alegria que os expostos tinham quando gastavam os dias nos asilos sem fundos, dependentes da caridade, longe da solidariedade social.

Vale a pena pensarmos nesta terrível evidencia.

A rã rebentou!"

Nota: a "rã candidata a ser boi" de que o autor fala inspira-se, certamente, na fábula do mesmo título que aqui se reproduz: http://sitededicas.ne10.uol.com.br/fabula21a.htm


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